Paraíso (im)perfeito

Vou contar um segredo, algo que você não deveria saber. Conversei com os anjos. Mandei cartas para as fadas. Emprestei o meu batom vermelho para a princesa encatada, a espera de seu príncipe. Cai em um mundo pararelo, do outro lado do espelho. Encontrei o paraíso e depois voltei para a terra.

Os lagos são limpos, todos de água cristalina. O sol é sempre agradável e o calor nunca nos deixa suar. A lua é cheia todas as noites. As estrelas brilham sob as nossas cabeças e nos contam segredos, e nos confessam que não é perfeito.

O castelo da princesa é cercado por espinhos e o corpo do seu príncipe encantado está lá, em algum lugar. Ela passa o dia chorando, sem saber que fim levou o seu amor desconhecido, aquele que foi-lhe prometido nos livros que a rainha lia. Passa a noite olhando pela janela, e não aprecia a beleza da lua, ou o brilho da estrelas, crava o seu olhar no horizonte que deveria lhe dar o amor prometido.

Os anjos odeiam a sua morada, e sentem tanta inveja. Queriam poder fazer o mal, poder gritar e sair correndo dizendo que Deus já morreu. Não agüentam o mundo perfeito onde as pessoas não vivem direito. É perfeito demais. Não conhecem a felicidade por que nunca sentiram a tristeza, não se apeguam a mentiras sobre o paraíso, por que eles moram lá e tudo é uma merda.

Ninguém pode falar. Os seres encatados do mundo perfeito não podem dizer a verdade sobre os seus desejos mais urgentes. Queriam jogar a perfeição, o pudor e a religião no chiqueiro onde vivem os porcos. Queriam poder derramar todas as lágrimas, e não precisar fingir que no paraíso são todos felizes.

Se pudessem viriam todos para a terra. Tranformando-se em pecadores, ateus e bêbados fudidos. Viriam todos de mãos dadas, e pela primeira vez sorririam podendo chorar, sorririam sem serem obrigados.

A princesa que quer ser puta.
Os anjos que promovem festas gays.
As estrelas que são apaixonadas pela a lua.
As fadas que querem ser bruxas.

Deixariam o paraíso largado as moscas e virariam mortais. Vivendo felizes e querendo viver, por que um dia vão morrer. Por que um dia tudo vai acabar e eles nunca mais precisarão abrir os olhos.

N.