Ei, tem alguém aí?

Meu som pifou, me conderam ao silêncio. Deveria denunciar, estou sendo submetida a tortura, uma tortura desumana. Quase duas horas sem fumar. Nicotina, nicotina, meu querido vício socialmente aceito, eu preciso de você correndo pelas minhas veias e fudendo com o meu pulmão!
Será que tem alguém aí apto a me levar embora dessa casa, dessas pessoas, desse colégio? Será que tem alguém aí que queira morar comigo em qualquer lugarzinho de quinta, escrevendo, fumando e bebendo vinho barato? Se tiver, por favor se manifeste, eu preciso fugir de casa com uma certa urgência.
De uma certa forma deixei de acreditar nas pessoas. Não foi hoje, nem ontem, já faz muito tempo que percebi a podridão da espécia humana. Era uma criacinha bonitinha com bochechas rosadas e franjinha em cima dos olhos, lá no maternal dois, a mais anti-social desde o começo. Um sapatinho de boneca, um lacinho no cabelo, batendo o pé, sempre mimada.
O mundo, com os seus não sei quantos bilhões de habitantes, é vazio aos meus olhos. Não sabem amar, não sabem viver, não sabem escrever, não sabem de nada. Pessoas que não merecem viver, e mesmo assim continuam entupindo as grandes cidades. Grandes ralos, cheios de cabelo, gozo seco, pentelhos, escarros. Palhaços castigados, putas arrombadas. Um bilhão de pessoas, eu não encontro ningué, vivo sozinha.
Eu e a minha solidão se arrastando para continuarmos vivas.
Eu e a minha solidão gritando e querendo morrer.
Gritando: Ei, tem alguém aí?

N.