Dias cegos, idéias legíveis demais

Já posso enxergar tudo bonito, tudo definido, sem uma nuvem de fumaça sobre os meus olhos. Calma, tudo bonito? É claro que não.
Sinto falta de poder enxergar todas as pessoas bonitas, todas as palavras carinhosas, o mundo perfeito.
Rostos indefinidos são bonitos. Palavras desconhecidas são carinhosas. O mundo quando você vive olhando para o seu próprio umbigo é lindo, só depende de você.
Então você coloca os óculos, as lentes. Você tem agora consciência do que está vendo. Enxerga perfeitamente bem o mundo imperfeito e sujo.
Aquela menina agora chora.
Aquele menino agora sangra.
Aquelas palavras não foram feitas para te ajudar, e sim para colocar o dedo na sua ferida mais profunda.
O mundo adquire um contorno definido, você não pode imaginar, você não pode mudar, as coisas estão prontas.
Então você fecha os olhos, tampa os ouvidos. Tenta tirar da sua frente coisas que você nunca pediu para ver, tenta tirar da sua cabeça aquelas vozes que você não pediu para ouvir.
A decisão não é sua, não é de ninguém. Vem com você a capacidade de enxergar direito ou não. Quem decide? Eu não sei.
Todos nós nascemos com problemas de visão, alguns com o tempo adquirem a capacidade de enxergar com o coração, outros com a mente.
E outros nunca conseguirão enxergar, e serão muito felizes assim.

N.